A gente não tinha nada para dar certo
Marcela passava a mão pelos cabelos, como sempre fazia quando se sentia nervosa. Era visível em seus olhos toda a aflição que seus pensamentos provocavam naquele momento.
— Não estou te entendendo, Marcela! — Rafael disse olhando nos olhos da garota.
— Estou confusa, Rafa… — ela passou a mão pelo cabelo mais uma vez.
— Sobre o que você quer conversar?
— Rafa, nossa relação é tão maluca… — Marcela fechou os olhos, respirou fundo e continuou colocando palavras dessincronizadas para fora — Esse vai e vem, essa coisa que não sabemos muito bem o que é… Essa mania de procurarmos um pelo outro apenas quando é conveniente…
— Como assim?
— Você é tão diferente de mim… Mas, ao mesmo tempo, tão parecido…
— Marcela, estou começando a ficar assustado! Não estou entendendo nada! — Rafael demonstrava impaciência.
— Calma… Eu simplesmente estava pensando sobre nós outro dia…
Marcela deu uma pausa em sua fala para desligar a televisão. Eles estavam no quarto dela, sentados na mesma cama em que começaram aquela história em uma noite despretensiosa.
— Rafa… Que loucura esse mundo… A gente cruza com tanta gente e, de repente, nos apaixonamos por alguém, compartilhamos uma vida, e do nada as coisas acabam. — Marcela continou.
O celular dela tocou. Os dois desviaram o olhar para a tela do smartphone e viram “Gabriel” chamando. Marcela voltou o olhar para Rafael e depois pegou o celular para recusar a ligação. Foi impossível negar a tensão que se estabeleceu no ar depois daquele simples gesto.
— Rafa… A verdade é que você sabe que não podemos continuar com isso… — Marcela respirou fundo mais uma vez — Sempre fui tão sincera com você sobre o que eu queria e, infelizmente, não recebi isso de volta da sua parte. Pra mim tudo isso já acabou faz tempo, eu só estava tomando coragem para…
—É sério isso, Marcela? — Rafael parecia incrédulo.
— Eu fui muito clara, Rafa… Fui muito clara quando disse que não podia continuar daquele jeito. Você não ouviu ou simplesmente fingiu não ouvir para não precisar encarar a realidade.
— Mas…
— Rafa, a gente não tinha nada pra dar certo. Nada mesmo. E por algum motivo nós demos certo no nosso número contado de dias. Acontece que esses dias acabaram.
Rafael estava mudo e não olhava mais para Marcela. Com os braços cruzados, mantinha o olhar fixo no chão.
— Foi uma delícia dar certo com alguém que não tinha nada para dar certo. Alguém que eu nunca nem imaginei poder ter qualquer tipo de envolvimento… Mas…
— Acho que eu vou indo, Marcela… — Rafael se levantou e começou a caminhar até a porta.
— Imaginei que reagiria dessa forma. Você não é muito bom com palavras…
Rafael já estava abrindo a porta do apartamento quando virou o corpo para Marcela e olhou fixamente em seus olhos.
— Você tem razão. A gente não tinha nada para dar certo. Deve ser por isso que demos tão certo esse tempo todo. — ele deu um beijo na bochecha de Marcela e foi embora.
Marcela fechou a porta e caiu no choro. Ela sabia que não podiam continuar. Ela sabia. Rafael apenas não tinha conseguido enxergar isso ainda. Ele estava completamente acomodado. Mas a verdade era que quanto mais cedo ela desse um basta naquilo, mais fácil seria seguir em frente. Sim, eles não tinham nada para dar certo e acabaram dando. E não é assim que são os relacionamentos? Dão certo de repente e quando menos esperamos, mas muitas vezes acabam mais de repente ainda.