Não sou de ninguém

cronicas
Bruna Cosenza
7 de junho de 2024

Quanto mais vou a casamentos realizados nos moldes tradicionais, mais certeza tenho de que não me identifico nem um pouco com todo esse formato de celebração.

De todas as tradições que se repetem sem fim, uma das que mais me incomoda é a mulher entrar no local da cerimônia acompanhada do pai — ou outra figura paternal e, em alguns casos, até mesmo maternal — e ser entregue a outro homem.

É sério que as pessoas não acham isso ultrapassado?

O ritual como um todo coloca a mulher, mais uma vez, em uma posição passiva: uma “mercadoria” que passa de homem para homem.

Por que elas não entram sozinhas? Ou, melhor ainda, na companhia do futuro marido? Por que criamos todo esse mistério em torno da entrada da mulher? Na minha cabeça não faz sentido.

Já passei dias e noites refletindo sobre o assunto, conversei com amigas, levei a pauta para a terapia e, enfim, sinto que estou cada vez mais próxima das minhas verdades sobre esse tipo de celebração (e que fique claro que cada um tem as suas).

A maior e mais importante delas é que não sou de ninguém e, por isso, jamais poderia ser entregue a um homem. Não tenho dúvidas de que muitas mulheres apenas acham bonito o pai as levando até o altar e, se fossem confrontadas, diriam que não concordam com o verdadeiro simbolismo deste ato.

Mas, para mim, é aí que está o problema. As pessoas não pensam, reproduzem. Por que a maioria não se questiona sobre ser levada de um homem para o outro e o que isso significa na essência?

Esses rituais começaram a ser praticados a milhares de anos. Sei lá quem foi que estabeleceu tudo isso e me parece que já passou da hora de questionarmos os moldes tradicionais e criar novas formas de celebrar o amor.

Inclusive, tenho um casal de amigos que vai se casar no final deste ano e a celebração que estão organizando vai na contramão de tudo o que já presenciei. Será na casa dos pais da noiva e ela já me disse que vai receber todos os convidados logo na entrada e podemos ir vestidos como quisermos, não há regras. Além disso, a festa não vai ter um bar de drinks e quando questionei o motivo, ela me disse que eles não gostam desse tipo de bebida, então qual é o sentido de apenas seguir o protocolo?

Confesso que estou curiosa para essa festa e orgulhosa dos noivos por não se deixarem levar por tantas prescrições e priorizarem a autenticidade, ou seja, o que faz sentido de verdade para eles.

Não desejo fazer esse tipo de celebração, mas em outra dimensão em que eu realizo uma festa de casamento, teria orgulho de responder às pessoas que me perguntam “por que você não entrou com o seu pai?” que eu não sou de ninguém além de mim mesma. E eu me orgulho disso. Acho que não tem nada mais bonito do que caminhar sozinha ou lado a lado com a pessoa que amo.