“Soul”: um convite à reflexão sobre o sentido da vida
O novo filme da Pixar, “Soul”, é um grande presente que ganhamos no final de 2020. A linda mensagem por trás da animação nos faz refletir sobre diversas questões existenciais.
A história gira em torno de Joe Gardner, que apesar de ser professor de música em uma escola, tem o grande sonho de ser um grande músico de jazz. E essa oportunidade chega quando ele é convidado para ser o pianista da banda de uma renomada artista. Infelizmente, logo após receber a ótima notícia, Joe sofre um acidente e é a partir daí que o conflito se desenrola.
De volta à Pré-Vida
Assim que Joe está entre a vida e a morte, ele se depara com uma nova realidade, em que a sua alma está separada do seu corpo. A partir de então, ele começa a entender a sua nova situação e procura formas de voltar ao seu corpo para, enfim, viver a sua grande oportunidade na música, o momento pelo qual ansiava há tantos anos.
Nessa realidade da Pré-Vida, Joe entende como as personalidades das almas se formam antes de irem para a Terra viverem nos corpos de seres humanos. Um dos processos pelos quais precisam passar é “encontrarem a sua missão”. Joe, por sua vez, é designado como o mentor de uma dessas almas, a chamada “22”. É só quando as almas encontram suas missões que podem viver uma vida na Terra.
A 22, no entanto, já passou por diversos mentores e nunca conseguiu encontrar a sua missão. Além disso, ela não tem vontade de ir para a Terra viver, acreditando que o dia a dia na Pré-Vida é muito mais satisfatório.
Muitas confusões acabam levando Joe e 22 de volta à Terra, mas é 22 quem acaba entrando no corpo de Joe. E o músico, por sua vez, cai no corpo de um gato. Juntos, eles vivem diversas aventuras e descobertas.
O significado da vida
Ao longo da história, nos deparamos com as transformações que acontecem tanto com Joe como com a 22. Juntos, eles refletem sobre a vida, o seu significado e suas missões.
Joe sempre teve muita certeza de que o seu propósito era ser músico, mas a 22 nunca soube qual era o seu. Essa busca, que também pode ser complexa e frustrante para nós humanos, faz com que a própria 22 se perca no meio do caminho.
É quando ela entra no corpo de Joe e começa a experimentar a vida de verdade (além da teoria na Pré-Vida) na Terra que se dá conta das maravilhas de viver.
Uma cena muito marcante é quando ela questiona Joe sobre o seu propósito: “E se o meu propósito for andar? E se for admirar o céu?”. O músico, por sua vez, responde: “Isso não é propósito, isso é só a vida!”
Joe está errado. A vida por si só já é um grande propósito e estar disposto vivê-la também é um enorme desafio.
Normalmente, associamos propósito a algo grandioso, como salvar vidas por meio da medicina ou inspirar mais mulheres a serem protagonistas de suas histórias. São lindos propósitos que dão um belo significado à vida, mas isso não quer dizer que funcionará da mesma forma para todo mundo.
O seu propósito pode ser simplesmente cultivar a empatia ou então reconhecer as pequenas alegrias do dia a dia. E mais: o seu propósito pode mudar ao longo da sua vida, afinal, nós mudamos também. O que ontem fazia sentido amanhã pode não fazer mais.
A 22 se sente deslocada por não ter um propósito grandioso como o de Joe, que é apaixonado pela música, mas ela tem uma enorme sensibilidade e aprecia a simplicidade da vida. Talvez esse seja o propósito dela. Não é promover a paz mundial, mas também é significativo.
Almas perdidas e o perigo da desconexão
Por fim, outro ponto que me chamou muita atenção no filme “Soul” foi a questão das “almas perdidas”. Trata-se de uma metáfora para falar sobre quem vive tão obcecado com algo que acaba se perdendo e se desconectando de si mesmo.
Um dos exemplos explorados é de um profissional de um banco de investimentos que está completamente obcecado e preso ao seu trabalho, vivendo como um zumbi. Ele é uma alma perdida.
Isso me fez pensar em quantas pessoas que conheço são almas perdidas por diversos motivos e não somente por conta do trabalho. O próprio Joe em alguns momentos me parecia tão obcecado pela música que não enxergava mais nada ao seu redor. Ele deixa as belas sutilezas da vida passarem e se desconecta das pessoas ao seu redor: os amores, os amigos e a família.
Amar algo é importante. Ter paixões é necessário para uma vida significativa, mas se perder no meio do caminho não é saudável. É preciso equilíbrio.
E me parece que a grande prova de que o equilíbrio é importante é que, muitas vezes, colocamos expectativas demais em nossas paixões, assim como Joe fez com a música. E quando chegamos lá, alcançamos o grande sonho, nem sempre a realidade atende as expectativas. Passamos tanto tempo cultivando aquele sonho que deixamos de aproveitar a caminhada e, obcecados, cruzamos a linha de chegada ansiosos demais e, às vezes, sozinhos.
Será que vale a pena?
As respostas podem não ser as mesmas, mas as perguntas precisam ser feitas
O filme “Soul” me fez pensar mais uma vez em como cada ser humano é único e em como os padrões de “sucesso” e “certo e errado” podem afetar a nossa trajetória.
Joe, por exemplo, vivia com a triste percepção de que sua mãe não apoiava a sua paixão pela música porque os músicos não tinham “sucesso”. A 22 se sentia completamente deslocada por não ter um propósito grandioso como achava que precisava ter.
O ponto é que cada um tem uma personalidade, determinados valores e sonhos. Não podemos tentar encontrar as mesmas respostas para todas as pessoas, afinal, cada indivíduo é único. O que podemos fazer são as perguntas que nos levarão aos questionamentos e reflexões necessários para termos uma vida mais significativa.
Viver no limbo, completamente alienado não é o caminho. O caminho é perguntar, tentar, errar, refletir, tentar mais uma vez, errar de novo, acertar. E viver com a capacidade de admirar cada dia com as suas pequenas belezas e alegrias. No fim, foi isso que Joe aprendeu… Mas para descobrir como foi esse processo para ele você precisa assistir ao filme também 🙂
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