Efeitos colaterais do nosso amor

cronicas
Bruna Cosenza
29 de setembro de 2015

Parecia ser um dia aparentemente comum. Era segunda-feira e o céu estava repleto de nuvens, por isso fiquei em dúvida se colocava ou não uma regata. Como todos os dias, o metrô estava lotado e os vendedores ambulantes apareciam aos montes pelas ruas.

Caminhava sem grandes expectativas para aquela segunda-feira. Como sempre, iria trabalhar, depois iria para a faculdade e, por fim, torceria para que o percurso até em casa fosse rápido o suficiente para não me dar tempo de pensar em você. Fazia alguns dias que não nos víamos e, como sempre, eu tinha aquela sensação de que estava tudo bem. Já estava me acostumando com o fato de que agora não passávamos de estranhos que se conheciam muito bem.

O problema é que essa falsa sensação de que está tudo bem é incrivelmente traiçoeira. Quando estamos distraídos com qualquer coisa, ela acaba nos obrigando a enfrentar aquilo que tentamos camuflar dia após dia. Realmente, não a vi chegando dessa vez. Tinha certeza de que seria apenas mais uma segunda-feira comum, tinha certeza de que continuaria mantendo minha atuação impecável.

Mas, no momento em que te vi ali sentado, meu coração pulou de uma forma estranhamente incomum, como se tivessem se esquecido de avisá-lo do teatrinho rotineiro. Senti uma coisa que, até agora, não sei denominar o que foi. Apenas senti. De certa forma, parecia que você estava escorregando das minhas mãos e eu não podia fazer nada para te segurar.

Sentei ao seu lado sem pensar nas consequências daquela atitude. Apenas sentei. Como se fosse uma tentativa de não te deixar escorregar pelas minhas mãos, mas, mesmo assim, parecia que nada te segurava. Decidi trocar duas palavras sobre algo aparentemente banal, só para ouvir o som da sua voz. Que erro. Fui completamente dominada pelo desespero de te ver desaparecendo, mas o problema é que eu não fazia a menor ideia do que estava acontecendo.

Como sempre, te vi indo embora e fiquei pensando como será no nosso último dia. O dia em que saberemos que não nos veremos mais. Entrei no carro, torcendo para aqueles pensamentos se dispersarem. Talvez tenham se dispersado, mas em forma de lágrimas. Chorei como se tivéssemos tido uma daquelas brigas, mas, dessa vez, eu sabia que nenhum de nós tinha feito nada de errado. Era apenas eu sentindo que nada estava certo.

Cheguei em casa com o coração saindo pela boca. Pensei em conversar com alguém, mas desisti. Só queria tomar um banho e dormir. Não consegui. Chorei mais, da mesma forma que chorei no dia em que nos perdemos. Senti uma dor subir pelo meu corpo até chegar na minha cabeça, e te senti em todas as partes do meu corpo. Você era aquela dor.

Olhei para a cômoda e vi a caixa que você me deu no Natal passado. Dentro estavam as duas únicas cartas que você me escreveu. Depois de ler, foi como se eu tivesse voltado no tempo, e não consegui me conformar que hoje aquelas folhas de papel eram apenas a materialização do nosso passado.

Resolvi me deitar. Sabia que nada além de dormir faria aquela dor passar. Repassei toda a nossa história em poucos segundos, e fiquei me perguntando por que ninguém nunca tinha me alertado sobre os efeitos colaterais do amor. Sobre sua capacidade de transformar segundas-feiras comuns em dias perturbadores. Meu último pensamento antes de cair no sono foi: “Amanhã é outro dia. Sempre tem outro dia. E, se tudo der certo, será uma terça-feira comum.”